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Classificação de tensões de sistemas elétricos de potência: uso prático e definições

Mar 20

4 min read

Em minhas atividades acadêmicas e com finalidade didática, estive compilando exemplos de níveis de tensões utilizados em sistemas elétricos de potência como o Sistema Interligado Nacional (SIN) brasileiro, e verificando o quanto a classificação de tensões desde a Baixa Tensão (BT) até a Ultra-Alta Tensão (UAT) está padronizada atualmente, tanto no Brasil como por instituições internacionais como a International Electrotechnical Commission (IEC) e o American National Standards Institute (ANSI).


A classificação de tensões, seja em Corrente Alternada (CA) ou Corrente Contínua (CC), é interessante e bastante utilizada em discussões práticas, pois rapidamente pode dar uma ideia do uso típico da instalação, sua capacidade de condução de corrente elétrica a certas distâncias com níveis de perdas e quedas de tensão adequados, aspectos tecnológicos, tempo de implantação, custos etc.


No Brasil, por exemplo, uma Distribuidora pode utilizar BT (ex.: 220/127 V CA) para distribuição de eletricidade a consumidores de menor carga instalada e a distâncias consideradas curtas em relação à Média Tensão (MT) (ex.: 13,8 kV CA), que por sua vez é usada para distribuir eletricidade, em maior nível de potência, da saída da Subestação de Distribuição (SED) para áreas urbanas abrangendo vários bairros ou áreas não urbanas mais afastadas, ou para a alimentação de Unidades Consumidoras de Média Tensão (UCMT).


Já a entrada de uma SED é usualmente conectada a uma Linha de Distribuição (LD) em Alta Tensão (AT) (ex.: 138 kV CA) que está ligada ao Sistema de Distribuição de Alta Tensão (SDAT) da Distribuidora ou às Demais Instalações de Transmissão (DIT) de uma Transmissora. Unidades Consumidoras de Alta Tensão (UCAT) com tensão de atendimento ≥ 69 kV e ≤ 138 kV podem estar conectadas ao SDAT ou à DIT. E o SDAT ou a DIT se conectam à saída de uma Subestação de Transmissão.


A Subestação de Transmissão pode, por exemplo, converter uma tensão de entrada de 230 kV CA (designada usualmente como Extra Alta Tensão – EAT, termo que ainda não tem definição regulatória ou normativa no Brasil) para uma tensão de saída de 138 kV CA (AT) que alimenta o SDAT da Distribuidora ou a DIT da Transmissora.


Além das linhas elétricas, outros componentes fundamentais dos circuitos de transmissão e distribuição em CA são os transformadores, que diminuem ou elevam a tensão de acordo com uma relação de transformação (ex.: 230/138 kV, 138/13,8 kV e 13,8/0,22 kV).


Do lado da produção de energia elétrica, uma usina pode conter, por exemplo, unidades geradoras com tensão de saída em MT (ex.: 13,8 kV CA) que é elevada para 230 kV CA por meio de uma subestação cuja saída é interligada à Rede Básica (RB) do SIN.


As Linhas de Transmissão (LTs) que interligam a Subestação Foz do Iguaçu (PR) à Subestação Tijuco Preto (SP), associadas à transmissão da energia elétrica produzida pela Usina Hidrelétrica (UHE) de Itaipu em 60 Hz, utilizam tensão de 765 kV CA, que em termos práticos seria considerada, usualmente, como o limite superior para EAT.


As tecnologias em CC do tipo High Voltage Direct Current (HVDC) são utilizadas para transmissão a longas distâncias ou conexão de sistemas CA assíncronos ou com frequências diferentes. No Brasil, temos:

  • Bipolo Foz do Iguaçu (PR) – Ibiúna (SP) em ± 600 kV CC (as tensões dos polos positivo e negativo são em relação à terra), associado à transmissão de parte da energia elétrica produzida pela UHE Itaipu em 50 Hz;

  • Bipolo Coletora Porto Velho (RO) – Araraquara (SP) em ± 600 kV CC, associado às UHEs Santo Antônio e Jirau;

  • Bipolo Xingu (PA) – Terminal Rio (RJ) em ± 800 kV CC, associado à UHE Belo Monte;

  • Bipolo Graça Aranha (MA) – Silvânia (GO) em ± 800 kV CC, em implantação, cuja principal função será transmitir energia elétrica produzida a partir das fontes eólica e solar do Subsistema Nordeste para o Subsistema Sudeste – Centro-Oeste do SIN.


No exemplo neste link, o sistema HVDC em ± 800 kV CC associado à UHE Belo Monte é mencionado como sendo de UAT, classificação que, a rigor, ainda não tem definição formal no Brasil.


A IEC, cujos padrões têm servido como base para diversas normas técnicas da ABNT, publicou em 2020 sobre uma iniciativa para a padronização de sistemas de transmissão em UAT (ou Ultra High Voltage - UHV), que pelo que consta ainda está em andamento.


A norma norte-americana ANSI C84.1-2020 estabelece classificações de tensões nominais e tolerâncias operacionais para sistemas de CA em 60 Hz acima de 100 V e até 1200 kV, porém, não trata de sistemas em CC.


Como pode ser verificado na tabela anexa a esse post, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) define no Módulo 1 dos Procedimentos de Distribuição de Energia Elétrica do Sistema Elétrico Nacional (PRODIST) as classificações de BT, MT e AT, com suas respectivas faixas de valores nominais de tensão (valores eficazes entre fases, como todos os demais valores de tensões em CA mencionados neste texto).


Por outro lado, as normas técnicas de instalações elétricas de BT e MT da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) usam faixas de valores diferentes das do PRODIST para as classificações BT e MT, como pode ser visto na tabela mencionada anteriormente.


Classificar é um ato humano comum em diversas áreas do conhecimento e da tecnologia. Ele tem sua utilidade, como nos lembra a expressão "dividir para conquistar", que poderíamos adaptar para "dividir para conhecer".


No caso da classificação das tensões de sistemas elétricos de potência, verifica-se que ainda não há uma uniformidade entre o uso prático e as definições, por vezes por falta dessas. Isso, na nossa visão, é um possível ponto de melhoria a ser observado em termos regulatórios e normativos.



por Matheus Sabino Viana, DSc

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